terça-feira, 5 de maio de 2009

Sobre o Global Summit em Paris

04/05/2009 14:15:22

por Ricardo Young


Entre os dias 19 e 23 de abril, ocorreu em Paris o Global Summit, evento organizado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Unep) que reúne empresas, governos e diversos órgãos da ONU discutindo os avanços e os entraves para uma sociedade sustentável. O tema central do evento foi “O imperativo verde: liderança, inovação e tecnologia”.

A ideia por trás do tema era: a economia verde virá, já está aí embrionária. Vamos discutir “como” ela será. Em resumo, as empresas querem saber quais serão as responsabilidades de cada um nesta nova economia. Se os governos proverão sistemas regulatórios adequados a investimentos de longo prazo; se as empresas terão que se organizar para induzir tais políticas. O palco da discussão será Copenhague, onde, no final do ano, governos, empresas e sociedade civil vão discutir novos parâmetros para a redução das emissões de carbono, num protocolo que substituirá o de Quioto. Lá, ficará cada vez mais evidente o apetite dos países em liderar o processo ou se a dependência dos mercados retardarão o processo.

Alguns governos já saíram na frente, como a China. Com os seus enormes excedentes, o país começa a investir maciçamente em alternativas energéticas e, ao lado dos EUA e Alemanha, poderá definir as novas fontes e as novas matrizes energéticas para o século 21. Estas matrizes, por sua vez, concordam todos, serão diversificadas e descentralizadas.

Dois outros acontecimentos importantes: o depoimento do representante da Comissão Stiglitz, que estuda o novo PIB. Haverá, sem dúvida, mudanças no conceito de riqueza nacional, acrescentando-se aos cálculos atuais medidas que indiquem a qualidade de vida e a riqueza produzida na base da pirâmide como serviços ambientais, domésticos e de saúde popular. Outra iniciativa importante abordada no Global Summmit foi a constituição de um Green Economy New Deal (um “new deal” baseado na economia verde), projeto encabeçado pelo economista indiano Pavan Sukhdev, que pretende atingir quatro objetivos: reavivar a economia mundial e proteger os mais vulneráveis; reduzir a dependência do carbono, a depredação do ecossistema e a escassez de água; eliminar a pobreza persistente até 2025; e cumprir as metas do milênio.

No entanto, o momento mais emocionante de uma conferência cheia de temas desafiadores foi a cerimônia do prêmio “Campeões da Terra”, entregue pela Unep a personalidades de destaque na proteção ao meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável.


Este ano, entre as pessoas premiadas estava Janine Benyus, escritora, inovadora científica e considerada a “mãe da biomimética”, uma nova disciplina que vem inspirando cientistas, designers, arquitetos e engenheiros a emprestar da natureza soluções ou “modos de funcionamento”, testados ao longo de milhões de anos, que podem resolver os problemas de sustentabilidade que estamos enfrentando. Não se trata de ecoeficiência, mas de “copiar” (mimetizar) alguns sistemas de espécies vivas para substituir o já existente, normalmente baseado em alto uso de carbono ou de recursos naturais. Neste processo, não se subtrai nada da natureza, apenas se copia o que interessa. Por exemplo, alguns países já estão captando suas emissões de carbono e enterrando, num procedimento similar aos movimentos de inspiração / expiração dos pulmões dos mamíferos, especialmente dos humanos.

Janine formou-se “cum lauda” pela Universidade de Rutgers, nos EUA, em Gestão de Recursos Naturais e em Literatura Inglesa. Foi para Montana, onde deu aulas de inglês na Universidade e começou a participar de uma série de iniciativas da sociedade civil para recuperar / preservar as imensas florestas nativas do estado. Foi a partir deste trabalho que, nos anos 90, ela começou a desenvolver a teoria segundo a qual os seres humanos deveriam conscientemente copiar as soluções da Natureza, cujos quase 4 bilhões de anos de experiência acumulada estão sendo simplesmente destruídos pela ação humana.

Em 1998, Janine fundou o Instituto de Biomimética e uma consultoria chamada Innovation (inovação) para ajudar os empreendedores a entender e emular (copiar) os modelos naturais para desenvolver produtos e processos sustentáveis. O Instituto também tem o objetivo de disseminar a biomimética na cultura, tornando-a uma “coisa natural”, para facilitar a tarefa de transferir as idéias, designs e estratégias embutidas na natureza para a construção de um sistema sustentável de sociedade (e de economia).

Na verdade, trata-se de retomar o fio da meada de um conhecimento que foi relegado, e mesmo esquecido, a partir da segunda década do século 19. Neste período, com o desenvolvimento dos motores a vapor, bem como da química do cloro e da soda, houve uma revolução nos processos industriais até então praticados. E todo um conhecimento da natureza foi posto de lado em prol do “avanço científico” baseado não mais na cópia da natureza, mas na invenção de outra natureza. Se este processo trouxe incríveis avanços para a humanidade, também nos levou à encruzilhada que estamos. Somos seres deste mundo natural, precisamos (re)aprender a copiá-lo, não a destruí-lo.

Por isso, o biomimetismo vem sendo apontado como a base de uma nova revolução industrial, cujo pressuposto não será mecanização e expansão de mercados, mas fusão de conhecimento da natureza com competitividade não destrutiva. Será uma revolução para retificar e mesmo “descontinuar” os danos causados pela industrialização predadora que conhecemos até hoje. Janine Benyus é uma pioneira deste novo mundo.

Quem quiser verificar pode acessar http://www.biomimicry.net/

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